Eleitorado evangélico é a principal base de apoio a Bolsonaro, que tem avaliação positiva de 38%. Fato que mantém o presidente com 28% de aprovação na pesquisa.
Para cientista político, o cenário atual de baixa aprovação do presidente Jair Bolsonaro o que pode compromete seu projeto de reeleição em 2022. |
No pior momento da pandemia e ainda sem a retomada do pagamento do auxílio emergencial, a aprovação do presidente Jair Bolsonaro aparece abaixo do patamar de 30% da população, segundo pesquisa do IPEC (Inteligência, Pesquisa e Consultoria). O levantamento, realizado entre 18 e 23 de fevereiro, aponta que 28% dos entrevistados consideram a gestão Bolsonaro ótima ou boa, enquanto 39% avaliam como ruim ou péssima. Segundo os dados do IPEC, o eleitorado evangélico é a principal base de apoio a Bolsonaro, que tem avaliação positiva de 38% neste segmento. A margem de erro é de dois pontos.
Em levantamentos de institutos como Datafolha e Ibope em 2020, o nível de aprovação geral do governo Bolsonaro quase sempre ultrapassava um terço da população. Em dezembro, apesar do aumento de mortes em decorrência da Covid-19 após as eleições municipais, o presidente manteve 37% de aprovação. Já no fim de janeiro, primeiro mês após o fim do pagamento das parcelas de R$ 300 do auxílio emergencial, o Datafolha apontou queda nas avaliações positivas, com 31% considerando o governo ótimo ou bom, e rejeição na casa de 40%. A retomada do auxílio, agora em quatro parcelas de R$ 250 cada, faz parte da PEC Emergencial no Senado.
O IPEC, instituto formado por executivos que deixaram o Ibope após o encerramento das atividades com pesquisas de opinião pública, aponta ainda neste levantamento que, para 87% dos brasileiros, há alguma expectativa de pagamento do auxílio emergencial “até a situação econômica voltar ao normal” o que pressupõe um prazo maior do que os quatro meses do planejamento do governo federal. Segundo a pesquisa, 72% concordam totalmente com esta visão; 15% concordam em parte.
91% do nordeste
O maior clamor por uma disponibilização prolongada do auxílio vem do Nordeste, onde 91% concordam total ou parcialmente que o benefício deve ser pago até que o cenário econômico esteja em normalidade. As regiões Norte/Centro-Oeste e Sudeste aparecem com 87% de concordância parcial ou total neste item, enquanto o Sul tem 80%.
No recorte por renda, 93% dos que têm renda mensal de até um salário mínimo parcela da população à qual o benefício é majoritariamente destinado concordam, ao menos de forma parcial, que o auxílio deve durar até uma normalidade econômica. Ontem, a divulgação do PIB de 2020 pelo IBGE apontou que o país não se recuperou do impacto da pandemia da Covid-19, fechando o ano com um rombo de 4,1%. Na última semana, Bolsonaro afirmou que o benefício “custa caro” e representa “um endividamento enorme”, ao justificar que a União não poderia pagar o auxílio indefinidamente.
Para a cientista política Luciana Veiga, professora da Unirio, o cenário atual de baixa aprovação, na medida em que traz preocupações para Bolsonaro em seu projeto de reeleição em 2022, pode estimular o presidente a tentar um prolongamento do benefício, contrariando suas próprias declarações e as projeções da área econômica, comandada pelo ministro Paulo Guedes. A especialista observa que, segundo a pesquisa do IPEC, nos estratos de menor remuneração e no Nordeste a avaliação do governo como regular fica acima da média nacional.
"O que Bolsonaro faz com o auxílio não é conquistar eleitores que não gostam dele, mas sim trazer o que está nesse bloco do regular. É um eleitor muito prático, menos apegado a questões ideológicas, e que pode oscilar a depender do impacto do governo federal em sua vida. É aí que entra o auxílio. Por outro lado, este eleitor também é mais pressionado pelo cenário da Saúde, já que depende da rede pública" avaliou Veiga.
A CEO do IPEC, Márcia Cavalari, afirma que a análise dos resultados deve levar em consideração o contexto à época da realização das pesquisas. O levantamento do IPEC, que ouviu 2.002 pessoas presencialmente em 143 municípios, ocorreu nos dias que se seguiram à primeira ameaça de Bolsonaro de trocar o comando da Petrobras por insatisfação com aumentos nos preços de combustíveis, o que gerou reação negativa do mercado, com forte queda no valor das ações da empresa. O anúncio da demissão de Roberto Castelo Branco da presidência da petroleira ocorreu no dia 19, durante a realização da pesquisa.
"Esta é uma das possíveis hipóteses para que a rejeição ao governo seja mais alta entre os eleitores com maior remuneração do que entre os mais pobres. Para o segmento de menor renda, a troca pode não ter soado tão ruim, por conta do discurso de baratear o combustível" afirmou Márcia.
Entre os eleitores que declaram renda mensal superior a cinco salários mínimos, 47% disseram considerar o governo ruim ou péssimo, enquanto 24% consideram ótimo ou bom. Entre os mais pobres, com renda de até um salário mínimo, o nível de aprovação é semelhante (26%), mas o percentual dos que rejeitam o governo é bem menor: 38%.
Acenos conservadores
A parcela evangélica do eleitorado apresenta, na pesquisa do IPEC, um desenho inverso em relação à avaliação geral do governo. Neste segmento, é o percentual de avaliações como ótimo ou bom que se aproxima da faixa de 40% dos entrevistados e não a rejeição, como ocorre no recorte mais amplo da pesquisa. Entre os evangélicos, 27% consideram o governo ruim ou péssimo. É a menor taxa de rejeição registrada em todo o levantamento.
Para a cientista política Luciana Veiga, a situação se explica pelo fato de Bolsonaro se manter “sem inconsistências” na defesa da chamada pauta de costumes ao longo do mandato o que difere, segundo a especialista, do comportamento oscilante em outras bandeiras, como a agenda econômica liberal e a pauta anticorrupção. Nos dois primeiros anos de governo, Bolsonaro procurou fazer acenos recorrentes a lideranças evangélicas que atuam em igrejas espalhadas pelo país, e que já o haviam apoiado durante as eleições de 2018. O presidente tem prometido que indicará um evangélico para a próxima vaga que se abrirá no Supremo Tribunal Federal (STF), em julho, com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello. (Por Bernardo Mello/O Globo)