Bolsonaro, o único presidente a escolher um embaixador que não pode deixar o país

Bolsonaro, o único presidente a escolher um embaixador que não pode deixar o país

Acusado e preso por corrupção, Crivella está proibido deixar o Brasil, mesmo assim, Bolsonaro indicou o ex-prefeito do Rio ao posto de embaixador na África do Sul.

Presidente da Republica Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (Republicanos).


Quando Joe Biden venceu a eleição americana, Jair Bolsonaro levou mais de um mês para felicitá-lo.

Sua diplomacia acreditava na lorota de Donald Trump, que dizia ter sido roubado. Quatro dias depois da eleição de Pedro Castillo, o capitão disse que “perdemos agora o Peru”, pois a seu juízo “só um milagre” reverterá a derrota de Keiko Fujimori.

Demorou para reconhecer um resultado e apressou-se para admitir o outro. Nomeando Marcelo Crivella para a representação do Brasil na África do Sul, Bolsonaro entra para os anais da diplomacia como o primeiro chefe de Estado a nomear um embaixador que está proibido de deixar o país pela Justiça. (texto: Elio Gaspari)

Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a embaixada do Brasil na África do Sul, o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos) está proibido de deixar o país. Isso porque ele teve seu passaporte apreendido em fevereiro, após decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que revogou sua prisão domiciliar.

A escolha de Crivella para embaixador acontece em meio à pressão de líderes religiosos ligados à Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Há meses, eles enfrentam problemas no continente africano, especialmente em Angola, que tem denunciado pastores brasileiros sob suspeita de lavagem de dinheiro.

A indicação, porém, ainda depende de aprovação do Senado, independentemente de uma possível resposta positiva da África do Sul.

Crivella é acusado de ter comandado um suposto esquema de pagamentos a credores da prefeitura do Rio em troca de propina. Na denúncia apresentada à Justiça, o MP (Ministério Público) estadual apontou que o "QG da propina", como ficou conhecido, arrecadou mais de R$ 53 milhões em depósitos feitos de modo pulverizado para mais de 20 empresas de fachada, em nome de laranjas, criadas pelo grupo de Crivella.

As investigações começaram a partir da delação do doleiro Sérgio Mizrahy, que relatou como funcionava o "QG da propina". No suposto esquema, Rafael Alves, que não era nomeado mas despachava na prefeitura, aliciava empresas que queriam firmar contratos com o governo ou precisavam receber restos a pagar por serviços prestados. Para furar a fila, elas pagavam de 3% a 5% em propina sobre os valores.

O ex-prefeito chegou a ser preso em 22 de dezembro de 2020, após operação conjunta do MP-RJ e da Polícia Civil, mas passou apenas uma noite na cadeia. No mesmo dia, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) substituiu a prisão preventiva por domiciliar.

Mesmo que agora esteja livre da prisão e, consequentemente, do uso de tornozeleira eletrônica, Crivella não pode deixar o Brasil, nem manter contato com os demais investigados na ação. O ex-prefeito também deve comparecer periodicamente em juízo para informar e justificar atividades, segundo definido por Gilmar Mendes.

Neste processo, que corre na Justiça Eleitoral, Crivella já é réu por corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa.