Rachadinhas?: Salários congelados há 14 anos devem bancar esquema de verba de R$ 5 mil para vereadores de Itapetinga

Nos bastidores do Legislativo, vereadores articulam manter congelamento de salários dos assessores para turbinar verbas de gabinete, com cheiro de rachadinha no ar.

 

Rachadinhas?: Salários congelados há 14 anos devem bancar esquema de verba de R$ 5 mil para vereadores de Itapetinga
Vereadores da Câmara Municipal de Itapetinga com o prefeito Eduardo Hagge (MDB) e seu vice.

À medida que os repasses mensais da Prefeitura de Itapetinga à Câmara Municipal, os famosos duodécimos, se aproximam da marca de 1 milhão de reais, o que se vê entre os vereadores é uma corrida desenfreada por uma fatia maior dessa verba pública. Nos bastidores do Legislativo, cresce uma verdadeira obsessão por transformar os recursos em benefício próprio, mesmo que isso custe o sacrifício dos próprios servidores comissionados [assessores parlamentares] da Casa.

Com os olhos vidrados nos milhões, os vereadores pressionam o presidente da Câmara, Luciano Almeida (MDB), a acelerar a liberação das chamadas verbas de gabinete. O impasse está no valor: enquanto discutem se o repasse individual será de R$ 4 mil ou R$ 5 mil, já se articula nos bastidores de onde cortar para viabilizar o esquema, e a conta, como sempre, deve cair no colo dos mais fracos.

Sem qualquer pudor, os parlamentares decidiram que a verba extra virá do congelamento de 14 anos nos salários dos assessores parlamentares e cargos comissionados da Mesa Diretora. Em conversas reservadas no gabinete da presidência, optaram, sem qualquer resistência, por manter os assessores em condições salariais degradantes para garantir o próprio “pirão”.

Mas a farsa não para por aí. Para manter as aparências, os vereadores decidiram encenar uma suposta luta por melhores salários aos servidores, ou assessores, enquanto, na prática, fingem defender seus próximos com a faca no pescoço do presidente da Câmara.

Segundo fontes próximas aos vereadores, a reunião que selou o acordo ganhou contornos de filme mafioso. Ao serem alertados de que as verbas de gabinete dos vereadores seriam fiscalizadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), o encontro assumiu tons de “Cosa Nostra”, com debates sobre como manipular os gastos para escapar da fiscalização.

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A proposta inicial? Contratar “terceirizados” para os gabinetes de prestadores de serviços laranjas, o velho disfarce para o conhecido esquema de ‘rachadinha’. O restante da verba, segundo os mesmos interlocutores, seria usado para bancar blogueiros locais e inflar artificialmente a imagem dos parlamentares nas redes sociais.

A atual legislatura parece ter esquecido, ou ignorado, as cicatrizes deixadas pelos escândalos de 2019, quando o site IDenuncias surgiu para expôs esquemas similares na Câmara, o que culminou, em 2020, no maior “bota-fora” eleitoral da história política de Itapetinga: 11 dos 15 vereadores foram rejeitados nas urnas.

Vale lembrar: após as denúncias do IDenuncias, os esquemas envolvendo assessores parlamentares “laranjas” na Câmara de Itapetinga até diminuíram, mas não cessaram. A prática ilícita das rachadinhas segue ativa nos bastidores do Legislativo, alimentada pela omissão do Ministério Público local.

O promotor Gean Carlos Leão, à época responsável pelo caso, simplesmente ignorou as denúncias apresentadas pelo IDenuncias, mesmo com provas documentais consistentes. Seu argumento? As denúncias teriam partido de um “site anônimo”.

A justificativa do promotor, no entanto, contraria frontalmente decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que já reconheceu a legitimidade de denúncias anônimas quando acompanhadas de indícios concretos. Em diversas decisões, o então ministro Marco Aurélio de Mello, com o respaldo de outros membros da Corte, reiterou que esse tipo de denúncia pode e deve ser utilizado para instaurar investigações formais.

A omissão do MP de Itapetinga, portanto, não apenas fragilizou o combate à corrupção na Câmara, como abriu caminho para que as velhas práticas de desvio de verba e rachadinhas voltassem a prosperar, agora com ainda menos pudor.

Agora, com os melhores assessores já fora da Casa e um ambiente tomado por interesses escusos, o Parlamento caminha a passos largos para reviver seus piores momentos. O povo assiste, mais uma vez, à repetição do enredo vergonhoso que transforma a política local em balcão de negócios, e a Câmara, em teatro da enganação.

É rachadinhas, é vida que segue…